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4 de agosto de 2016

[CRÍTICA] Cinquenta Tons de Cinza (E. L. James, 2011)

Diversas vezes eu me pego perguntando por que determinada música faz sucesso, sendo tão claramente ruim, sem qualidade, de baixo nível. O mesmo acontece também para certos filmes bem sucedidos: mal dirigidos, mal roteirizados, mal atuados. Por que tais produtos de baixa qualidade atingem tanto sucesso? Muitas podem ser as teorias para responder essa questão. Aqui, não tento responder a essa pergunta, apenas trago um exemplar dessa tendência no mundo da literatura: o patético Cinquenta Tons de Cinza (E. L. James, 2011).

Anastasia Steele é uma jovem desastrada que tem uma escassa experiência em relacionamentos amorosos, até que conhece o multimilionário sedutor Christian Grey e se relaciona com ele. Logo, porém, ela descobre o lado BDSM de seu novo amor, e se coloca diante de um dilema: prosseguir com o romance, ou deixá-lo de lado?

Bem, por onde começar? A narrativa do livro é patética – repetitiva, com um vocabulário pobre e repleta de descrições vergonhas. Perto de Cinquenta Tons de Cinza, O Orfanato da Srta. Peregrine (Ransom Riggs, 2011) se torna O Sol épara Todos (Harper Lee, 1960), em matéria de narração em primeira pessoa. O livro é arrastado ao extremo, e absolutamente NADA de empolgante acontece ao longo da história. Eu não estou exagerando: aqui não existe uma estrutura típica de três atos (apresentação dos personagens, estabelecimento da trama, resolução). Há apenas uma sucessão de situações fastidiosas, sem importância alguma e que impedem a trama de decolar – formaturas, jantares, compras, etc.

Os personagens do livro são sofríveis. Anastasia Steele é insegura a ponto de ser insultante às mulheres reais; Christian Grey é antipático e inverossímil; José, Kate, Taylor e outros não tem uma função bem definida na trama e somem e reaparecerem sem acrescentar muita coisa. Porém, me questionando a respeito de qual dos insuportáveis personagens do livro é mais detestável, cheguei à conclusão de que é a tal deusa interior, que fica sambando, dançando merengue com passos de salsa e orgulhosa pelo bom desempenho de Anastasia no ato de engolir sêmen.

O livro é o extremo oposto de O Retrato de Dorian Gray (Oscar Wilde, 1890). Enquanto aquele é o livro – dos que li até hoje – com a maior concentração de boas frases por página, este Cinquenta Tons de Cinza é o que possui a maior quantidade de frases imbecis por parágrafo. As comparações da narradora são ridículas, as citações são repetitivas (Ícaro, Tess of the d’Urbervilles, etc), a descrição de momentos e emoções é completamente piegas. Brindo-vos com algumas dessas maravilhosas frases:

“Sua voz é morna e rouca, como calda de caramelo derretido em chocolate escuro… ou algo assim.”
“Eu sinto a cor em meu rosto subindo novamente. Eu devo estar da cor do Manifesto Comunista.”
“Davi de Michelangelo não e nada comparado a ele.”

(Vale ressaltar que a autora ainda comete a atrocidade de relembrar algumas frases ao longo do livro, nos fazendo lê-las duas vezes.)

Claro, o livro se vende por seu teor sexual e por seu conteúdo BDSM, sendo um objeto de curiosidade do público. De qualquer forma, deixando de lado toda a questão moral e me focando apenas em aspectos técnicos: as cenas de sexo são chaaaaatas. Logo elas se tornam repetitivas e entediantes, como todo o restante do livro – o que mostra, claramente, que se trata de um sério problema de escrita.

Sobre o relacionamento dos personagens principais. Qual é o mérito de Anastasia em se apaixonar por um cara que tem todas as qualidades possíveis (milionário, bonito, culto, com uma garagem cheia de Audis, um helicóptero e um jato particulares, pianista...)? Por outro lado, que motivo levou esse homem aparentemente quase perfeito a se envolver com uma garota sem nenhum atrativo especial? Em que momento o livro nos faz acreditar que ela possui reais motivos (não apenas por interesse) para aceitar todas as bizarrices que ele revela logo nos primeiros momentos? As famílias da história não tem absolutamente nenhum problema? São todos pais, mães e irmãos que vivem felizes?

Cinquenta Tons de Cinza é um livro bobo, pueril, mal escrito e com uma trama sofrível. Os personagens são absolutamente descartáveis e o romance principal não convence, sendo completamente inverossímil. O ritmo é arrastado ao extremo, e suas mais de 400 páginas demoram uma eternidade para serem superadas. Cinquenta Tons de Cinza é um livro abominável, e me fez lamentar cada segundo que investi em sua leitura.


Nota:

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